sábado, 23 de agosto de 2008

Cícero Dantas - Minha Terra Natal

Cícero Dantas – minha terra natal
Em Cícero Dantas nasci, vivi minha infância e o início da adolescência. Aprendi a amar e respeitar a natureza, apreciando o verde dos pastos do senhor Isaac e construí meus sonhos, mirando o Alto do Bem-Querer, até então, aos meus olhos, o pico mais alto do mundo. Nenhum mingau de milho até hoje se compara ao delicioso sabor do mingau de dona Palmira e nenhum passeio público me divertiu mais que o da Rua do Abrigo, depois do jantar. Do cartão postal do Alto dos Vieiras, fotografa-se a vista panorâmica de toda a cidade.
As escadarias do cemitério, de tantos degraus, me fizeram pensar nostalgicamente, na minha inocência, que poderiam alcançar os céus, enquanto o sino da igreja badalava em sinal de tristeza, quando estavam repletas de gente subindo lentamente. A igreja de Nossa Senhora do Bom Conselho, rodeada de jardins e superlotada nas missas do domingo, deixou lembranças abençoadas dos meus pais e de sua fé em Deus, além do encontro dos fiéis para ouvir o monsenhor Galvão e o padre Elias. Depois da missa, o bar de Carlito era ponto de encontro da juventude.
No Instituto Bom Conselho e depois no Ginásio Monsenhor Renato Galvão, minha mãe em sua missão: inesquecível professora Renota; o diretor, meu querido professor Manuel, também lecionava Português e percebia que eu não era boa aluna; para o querido Eronildes Amaral, ensinar inglês com aquele sotaque cicerodantense, de vogais abertas, era mais que um desafio, uma missão quase impossível. Zé Canário, sempre assoviando enquanto zelava a escola e a todos nós alunos, tão manso e educado...
Na descida da igreja, dia de segunda-feira, barracas espalhadas por setores de frutas, tecidos, animais, entre outros, compunham movimentada feira; no mercado, os ourives, um deles era Nicodemos, meu tão amado pai.
As festas Rubra, Rosa e Branca que aconteciam na ARB – Associação Recreativa Bonconselhense, a orquestra Los Guaranis, a juventude bonita e Nilta sempre muito linda, até hoje sinto orgulho de ser sua irmã. Os bancários do Banco do Brasil eram famosos. Uma vaca louca sempre estava a fazer arruaça na rua, como adivinhasse estar indo para o matadouro. Corridas de jegue e a poeira subindo... Roda de amigos na calçada da igreja: Bené, Galego de Didô, Alberto, Tarcísio. O cinema, as matinês, e Julião aprontando quando alguém o chamava de cunhado. A marcha de ensaios para o Sete de Setembro cumpria percurso até um depósito na Rua do Trecho.
São muitas as lembranças, relíquias que jamais se apagarão de minha memória: a garagem de ônibus de José Mendonça; a beleza de dona Maria, parecendo uma santa; a elegância de dona Nena; a sabedoria de seu Zé: bastava dar a data do nascimento para ele adivinhar o dia da semana que a gente havia nascido; o prefeito Dãozinho, sem dúvida, o homem mais bonito da cidade; a venda do senhor Dacruz, minha madrinha Alice, Nana, Hilda, Lídia, Bibide, nossos vizinhos: seu Antonio Cariri e dona Dete.
Naquela pequena cidade, a luz, gerada de motor a óleo, apagava às 22 horas. Não havia televisão, nem telefone, nem asfalto; a água de chuva empossada num açude chamado Nação, abastecia a população.
A necessidade de sair de Cícero Dantas para complementar estudos era comum a todos adolescentes. Alguns não o conseguiram por falta de recursos; outros foram e voltaram; outros, inclusive eu, não mais retornamos.
Visitei minha cidade durante algumas férias e não mais que isso. Aos 55 anos quando os sonhos passam a ser escassos, surge um: voltar a Cícero Dantas numa festa de agosto! Por mais de trinta vezes, planejei, sem realizá-lo. Sempre acontecia algo que impedia. Mas tudo tem seu dia, ainda que tarde! E neste ano de 2008, realizei o meu sonho junto com Nilta. Fomos ouvindo um CD com trezentas músicas de Roberto Carlos. Todas traziam lembranças vivas de um tempo maravilhoso. Nada havia de mal-resolvido, no meu coração: eu estava feliz e plena para viver belas emoções.
Reencontrar os amigos, em clima de festa, é uma experiência ímpar. Eu me esquecera do frio que faz na minha terra. Fotografar nossos amigos e cada pedacinho que ainda restou da cidade antiga me deixou feliz demais. Abraçar alguém desconhecido que se descobre ser aquele colega que a gente nunca esqueceu é simplesmente uma felicidade fantástica. Pena que o tempo é curto e muitos ainda estão lá a nos esperar.
Vai aqui um lembrete para José Mário, que por motivos superiores não concretizou o seu sonho de juntar toda nossa turma nesta festa de agosto: na próxima, estarei lá, com fé em Deus!
Obrigada, Cícero Dantas, pelo carinho!
Núbia Parente